quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Jobs não está nem aí para o Brasil


Por que a Apple vem ignorando o assédio das operadoras brasileiras, ansiosas para vender o iPhone no país.


Assim que foi lançado, o iPhone, o telefone celular da Apple, entrou para uma categoria especial de produtos - a dos campeões de vendas em seu primeiro dia de mercado. Com 146 000 unidades vorazmente disputadas pelos americanos entre os dias 29 e 30 de junho, o aparelho só fica atrás do iPod Video (também da Apple), que vendeu 200 000 aparelhos em sua estréia, em setembro de 2006. Naquele dia, milhares de fanáticos por tecnologia se aglomeraram nas portas das lojas da Apple nos Estados Unidos numa histeria coletiva para comprar o híbrido de celular, computador e MP3 player, que custa em média 500 dólares. No Brasil, não existe a menor chance de acontecer um frenesi como o que foi visto nas grandes cidades americanas - pelo menos no que depender da Apple. A empresa não tem pressa nem interesse em lançar o iPhone no mercado brasileiro, o que deve acontecer apenas em 2009. As três maiores empresas brasileiras de telefonia celular do país - a TIM, a Vivo e a Claro - tentam fazer com que a empresa de Steve Jobs reveja esse prazo. Até agora, a manobra mostrou-se infrutífera. "Eles estão desprezando um mercado potencial de 500 000 unidades por ano", afirma o executivo de uma das operadoras, que pediu para o nome ser mantido em sigilo para não prejudicar as negociações.

A pressa das operadoras de telefonia móvel para trazer o iPhone ao Brasil se explica por dois motivos. Primeiro, há, no lançamento do produto, uma oportunidade de construir ou reforçar uma imagem de inovação. Todas as operadoras querem ser a primeira empresa a vender o iPhone no país. "Quem conseguir isso ganha de imediato uma imagem de sofisticação, de ter largado na frente ao vender um produto revolucionário", afirma Dan Kirk, especialista em telecomunicações da consultoria Value Partners, em Londres. O segundo motivo está ligado ao modelo de negócios das operadoras, cuja receita com ligações convencionais vem caindo rapidamente nos últimos anos. Estima-se que um usuário de iPhone gaste até 40% mais do que um usuário de celular comum. Isso porque o produto vem acompanhado de um pacote de serviços que inclui compra de músicas, vídeos e uma conta de e-mail. Na operadora americana AT&T, que detém com exclusividade os direitos de exploração dos serviços para o iPhone, a receita com internet e downloads aumentou 67% desde o lançamento do aparelho, acréscimo de aproximadamente 1,7 bilhão de dólares ao caixa.

A operação para trazer o iPhone ao Brasil é crucial para as empresas de telefonia celular e tem envolvido diretamente a matriz das operadoras. Tanto a Telefónica na Espanha quanto a Telecom Italia incluíram em seu pacote de negociação na Europa um acordo para a América Latina - onde o Brasil é, disparado, o maior mercado. O mexicano Carlos Slim, dono da Claro, envolveu-se nas transações e teria se encontrado pessoalmente com Steve Jobs para tentar um acordo de exclusividade que incluísse o Brasil. Não houve, porém, segundo pessoas próximas à negociação, nenhum progresso. Não é segredo que a Apple vê o mercado brasileiro como marginal para seus produtos - seja ele de computadores, de MP3 players ou de celulares. No caso específico do iPhone, a empresa optou por negociar a venda dos aparelhos país a país e não globalmente, como fazem concorrentes como Nokia, Motorola, Samsung e Sony Ericsson. A estratégia acabou deixando o Brasil no final de uma enorme fila, atrás de Estados Unidos, Europa, Japão, China, Coréia e até mesmo do México. A decisão é priorizar mercados em que a empresa tem melhor desempenho.

Historicamente, o Brasil nunca foi relevante para a Apple. Apesar do apelo da marca e de seus fiéis admiradores, a participação da companhia no mercado de computadores é inferior a 1% - número que se mantém praticamente inalterado nos últimos cinco anos. A pesada carga tributária sobre importados corrói a competitividade de seus produtos. Os computadores da Apple chegam a custar no Brasil três vezes mais do que no exterior. "Sem uma fábrica brasileira, não há como competir em preços", diz um executivo de uma concorrente. A estrutura da operação no país reflete esse desinteresse da Apple. Até julho deste ano, a filial brasileira nem sequer tinha um presidente - o cargo passou cinco anos vago depois que seu último ocupante saiu, em 2002. O executivo Alexandre Szapiro acaba de assumir o posto com a missão de melhorar os resultados. "O problema é que a Apple tem tratado o mercado de celulares da mesma forma que o de computadores", diz Ricardo Araújo, analista de tecnologia da Itaú Corretora.

Por enquanto, os applemaníacos brasileiros que não querem esperar pelo andamento das negociações - e muito menos pelo lançamento oficial - acabam se valendo dos mesmos recursos utilizados pelos fanáticos de outros países. Um deles é comprar o aparelho nos Estados Unidos e habilitá-lo pela operadora AT&T. Em decorrência do acordo de exclusividade entre a Apple e a empresa americana de telefonia, o iPhone sai da fábrica com um bloqueio no software que impede a utilização por meio de outras operadoras. Para usar o iPhone no Brasil, o cliente paga uma tarifa de roaming internacional de 2,50 reais por minuto, o dobro da média nacional. Outro recurso é o desbloqueio do aparelho feito por hackers e especialistas em produtos tecnológicos - uma operação evidentemente clandestina. O serviço custa em média 800 reais e permite que clientes das redes de GSM das operadoras TIM, Vivo e Claro usem o aparelho sem mudar de número. O maior risco da gambiarra é ter o aparelho destroçado durante a intervenção por um hacker pouco habilidoso. "O fanatismo em torno da Apple não conhece fronteiras nem limites", afirma um distribuidor local da marca. "Já estamos importando alguns iPhones, e os pedidos não param de chegar." Calcula-se que pelo menos 2 000 brasileiros já usem o iPhone, seja por meio do roaming da AT&T, seja por aparelhos desbloqueados. Tudo à revelia de um aparentemente desinteressado Steve Jobs.

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